Antes mesmo do ‘bom dia’, sêo Álvaro entrou pela porta da cozinha e fez o comunicado a dona Leila: “Vou vender o supermercado!”. A esposa continuou servindo o café e nem se deu conta do fato, já que era comum a promessa que nunca se cumpria. Parecia só mais uma vez que a frase era pronunciada e usada de forma indiscriminada como fora várias vezes nos últimos anos, sempre que o cansaço batia. Mas desta vez ele estava decidido. Saiu de casa e rumou para o supermercado, mas antes teria um encontro com o possível comprador.
Sêo Álvaro, um pequeno empresário da cidadezinha de São Pedro dos Ferros, interior de Minas Gerais, já tinha se decidido. Naquele mesmo dia, não seria mais dono do estabelecimento que levava o nome da filha. Dona Leila era quem mais ficava à frente. Era ela quem lidava com os funcionários e com a clientela de anos. As assinaturas nas tradicionais cadernetas era a dela. Uma rubrica que fora mudando, de acordo com os anos, já que o nome também passou por reformas, depois do casamento com sêo Álvaro. Mas estava lá. Em cada uma das páginas. Eram clientes antigos. Alguns até de outras gerações, mesmo porque a cidade não tinha mais que seis mil habitantes e o supermercado já atendia a terceira geração de clientes.
A reunião com Haroldo não demorou 15 minutos. Foram acertados preço e condição para pagar o estabelecimento. Um aperto de mão selou a transação. A partir de meio dia daquela terça-feira, Sêo Álvaro não era mais o dono do Comercial Layse. Começava aí uma história carregada de tristeza, já que a população não admitia que o supermercado tivesse outro dono. Os funcionários não admitiam outros patrões. “Sem dona Leila? Não. Não trabalho mais!”, dizia uma funcionária que limpava as gôndolas fazia quase 10 anos. Os outros nem queriam tocar no assunto e, assim como cena de novela mexicana – daqueles dramalhões carregados! –, todos que trabalhavam no comercial se revoltaram e decidiram encerrar suas atividades.
A partir daí a cidade se enterrou num marasmo e numa tristeza sem precedentes que mudou a cara da pequena São Pedro dos Ferros. A notícia se espalhou rápido. Cidade pequena, línguas afiadas e assunto novo. Cardápio perfeito para que as fofoqueiras de plantão levassem o assunto adiante. Um choro incontrolável se abateu sob dona Anísia, vizinha mais antiga do supermercado. Quando ela foi informada de que o supermercado tinha sido vendido, a pressão arterial subiu de uma vez. Encaminhada ao pronto socorro, ela foi atendida rapidamente pelo médico. Enquanto ela era medicada, as vozes lá fora eram ouvidas, contando a notícia avassaladora: “Sêo Álvaro vendeu o supermercado!”. A cidade estava se afundando numa profunda tristeza.
O fato atravessou o rio que corta a cidade e chegou a outro Estado. No Espírito Santo, o filho recebeu a notícia com assombro. Tentou saber detalhes, mas não conseguia informação segura, já que os telefones da cidade ficaram congestionados, devido às inúmeras ligações dos moradores preocupados e desconsolados de São Pedro dos Ferros. Sem titubear, Paulo Augusto chamou a namorada, arrumou as malas rapidamente e rompeu o caminho até Minas Gerais. Horas de estrada, o primogênito chega à cidade-natal e não acredita no que vê. Faixas e cartazes estavam espalhados pelas ruas em manifestação pela venda do supermercado. Da zona rural, filas de carroças e carros-de-boi levavam os agricultores, que enfrentavam a poeira e o cansaço para se unir aos manifestantes urbanos. Durante uma semana a cidadezinha viveu o caos. Ninguém mais queria comprar no Comercial Layse. Dona Leila teve que contratar seguranças para organizar a fila de gente que se formara na porta de casa. Toda a cidade queria falar com ela e manifestar o sentimento de perda que sentiam.
Os dias passaram. Tentaram um boicote, inclusive com aquelas contas penduradas na caderneta. E foram fiéis à moratória! A merceariazinha – muito mais modesta – que fica do outro lado da rua, já começara a receber clientes ainda inimagináveis. Definitivamente, era o fim de um ciclo. O fim de uma era que de precioso havia somente a amizade. A partir de agora, a vida na pequena São Pedro dos Ferros teria de ser diferente. Mas logo, logo o vizinho vai começar a pedir açúcar pelo muro, vai ligar à meia-noite e chamar para provar o biscoito quentinho com café – e sem se preocupar com a insônia – e vai revirar a vida, conseguindo encarar, como se fosse sempre assim, a cara do novo dono do Comercial Layse.
Sêo Álvaro, um pequeno empresário da cidadezinha de São Pedro dos Ferros, interior de Minas Gerais, já tinha se decidido. Naquele mesmo dia, não seria mais dono do estabelecimento que levava o nome da filha. Dona Leila era quem mais ficava à frente. Era ela quem lidava com os funcionários e com a clientela de anos. As assinaturas nas tradicionais cadernetas era a dela. Uma rubrica que fora mudando, de acordo com os anos, já que o nome também passou por reformas, depois do casamento com sêo Álvaro. Mas estava lá. Em cada uma das páginas. Eram clientes antigos. Alguns até de outras gerações, mesmo porque a cidade não tinha mais que seis mil habitantes e o supermercado já atendia a terceira geração de clientes.
A reunião com Haroldo não demorou 15 minutos. Foram acertados preço e condição para pagar o estabelecimento. Um aperto de mão selou a transação. A partir de meio dia daquela terça-feira, Sêo Álvaro não era mais o dono do Comercial Layse. Começava aí uma história carregada de tristeza, já que a população não admitia que o supermercado tivesse outro dono. Os funcionários não admitiam outros patrões. “Sem dona Leila? Não. Não trabalho mais!”, dizia uma funcionária que limpava as gôndolas fazia quase 10 anos. Os outros nem queriam tocar no assunto e, assim como cena de novela mexicana – daqueles dramalhões carregados! –, todos que trabalhavam no comercial se revoltaram e decidiram encerrar suas atividades.
A partir daí a cidade se enterrou num marasmo e numa tristeza sem precedentes que mudou a cara da pequena São Pedro dos Ferros. A notícia se espalhou rápido. Cidade pequena, línguas afiadas e assunto novo. Cardápio perfeito para que as fofoqueiras de plantão levassem o assunto adiante. Um choro incontrolável se abateu sob dona Anísia, vizinha mais antiga do supermercado. Quando ela foi informada de que o supermercado tinha sido vendido, a pressão arterial subiu de uma vez. Encaminhada ao pronto socorro, ela foi atendida rapidamente pelo médico. Enquanto ela era medicada, as vozes lá fora eram ouvidas, contando a notícia avassaladora: “Sêo Álvaro vendeu o supermercado!”. A cidade estava se afundando numa profunda tristeza.
O fato atravessou o rio que corta a cidade e chegou a outro Estado. No Espírito Santo, o filho recebeu a notícia com assombro. Tentou saber detalhes, mas não conseguia informação segura, já que os telefones da cidade ficaram congestionados, devido às inúmeras ligações dos moradores preocupados e desconsolados de São Pedro dos Ferros. Sem titubear, Paulo Augusto chamou a namorada, arrumou as malas rapidamente e rompeu o caminho até Minas Gerais. Horas de estrada, o primogênito chega à cidade-natal e não acredita no que vê. Faixas e cartazes estavam espalhados pelas ruas em manifestação pela venda do supermercado. Da zona rural, filas de carroças e carros-de-boi levavam os agricultores, que enfrentavam a poeira e o cansaço para se unir aos manifestantes urbanos. Durante uma semana a cidadezinha viveu o caos. Ninguém mais queria comprar no Comercial Layse. Dona Leila teve que contratar seguranças para organizar a fila de gente que se formara na porta de casa. Toda a cidade queria falar com ela e manifestar o sentimento de perda que sentiam.
Os dias passaram. Tentaram um boicote, inclusive com aquelas contas penduradas na caderneta. E foram fiéis à moratória! A merceariazinha – muito mais modesta – que fica do outro lado da rua, já começara a receber clientes ainda inimagináveis. Definitivamente, era o fim de um ciclo. O fim de uma era que de precioso havia somente a amizade. A partir de agora, a vida na pequena São Pedro dos Ferros teria de ser diferente. Mas logo, logo o vizinho vai começar a pedir açúcar pelo muro, vai ligar à meia-noite e chamar para provar o biscoito quentinho com café – e sem se preocupar com a insônia – e vai revirar a vida, conseguindo encarar, como se fosse sempre assim, a cara do novo dono do Comercial Layse.
Um comentário:
:)
Adorei!
tô doida pra fazer igual seo Alvaro e mudar de ramo.
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