segunda-feira, 15 de abril de 2013

Festa na roça (é pra lá de bom...)


A saga de um relacionamento que começou numa rede social e acabou em casamento no interior de Goiás. Durante três meses eles “namoraram pela webcam”. Agora, ele veio para casar. E tudo acontecerá numa grande festa!

A festa de casamento vai começar na quinta-feira, assim que o avião do noivo pousar na aeroviária de Goiânia. Toda a turma – amigos, parentes e agregados – estarão à espera do rapaz com plaquinhas, balões, apitos e lembrancinhas regionais. Os homens, todos!, usando óculos Prada e as mulheres, todas!, com bolsa Michael Kors. Um garçom circulará pelo saguão da aeroviária servindo pamonha frita, carne de lata e pastelzinho de pequi, um breve esquenta do que será o cardápio da festa. No sistema de som local, claro, Leonardo, o embaixador de Goiás – e do tomate – no mundo, vai cantar os sucessos de toda a carreira, inclusive quando ainda havia Leandro. Os padrinhos vão aguardar o noivo na porta da sala de desembarque com uma palma branca. Não! Não será macumba. Apenas sinal de paz e amor.

Depois da gritaria e de toda euforia, todos sairão aglomerados do saguão da aeroviária, carregando o noivo nos ombros e gritando: “Com quem será... com quem será...”. No estacionamento, ele receberá uma camiseta com uma foto de todos os amigos, assinada por cada um, com a frase: “Seja bem-vindo para sempre no Goiás!”. Ele entra numa caminhonete gigante, cuja carroceria é usada única e exclusivamente para as caixas de som do potente Pioneer, que tocará, durante todo o trajeto, repertórios de todas as 4634548364 duplas sertanejas goianas. Serão 220 quilômetros até Iporá, a cidade dos pais da noiva. Os carros que seguirão a caminhonete estarão conectados e tocarão a mesma música. O encerramento do comboio será um trator, com uma carrocinha acoplada, levando barris de chope e um carregamento exclusivo de copos de plástico de 300 mililitros e ‘pêta’ de polvilho azedo, para o caso de um desavisado ter um ataque de hipoglicemia. Nem pense em Epocler, Engov e coisas do tipo. Goiano não precisa desses subterfúgios.

Nas aproximadas três horas – que devem se tornar umas seis – de circuito até a cidade do casório, a viagem deve ser divertida. Ninguém pode ficar calado mais que o tempo de engolir o chope. Apenas! Cada boteco de estrada, posto de gasolina, puteiro ou o que o valha, uma parada obrigatória de 15 minutos será feita. O noivo descerá da caminhonete, o volume da música será reduzido e ele fará um pequeno discurso. Sempre com um dos amigos-padrinhos ao lado, com uma dose de Ypióca na mão. Terminou o discurso, vira a dose. E segue o cortejo.

Na chegada à cidade, faixas espalhadas – duas em cada quarteirão – deixarão claro ao noivo a paixão da noiva, da família da noiva, dos parentes da noiva e a sacanagem dos amigos da noiva. Frases criativas tomarão a cidade, do tipo: “O ideal no casamento é que a mulher seja cega e o homem surdo”. Ou “O casamento é a única virtude ao alcance dos covardes”. Ou ainda: “Lutar pelo amor é bom, mas alcançá-lo sem luta é melhor”. Na chegada à casa dos pais da nubente, uma banda esperará o comboio e tocará o arrocha assim que o noivo descer da caminhonete, bêbado e vomitando, numa clara evidência que já queimou a largada, mas ainda permanece de pé depois de todas as paradas nos botecos, postos e puteiros da estrada. Será recebido pela família da noiva – pai e mãe – que tentarão, em vão, falar do orgulho que será tê-lo como um filho no seio familiar. O discurso da mãe será abortado, antes mesmo da primeira frase ser bradada, pela euforia etílica dos amigos, parentes e agregados que fazem parte do comboio.

Entrando em casa, as portas estarão decoradas com festões coloridos e brilhantes, ainda que faltem dez meses para a chegada de Papai Noel. Lá dentro o som vibra e faz tremer tudo que não esteja fincado ao chão com alicerce de base firme, tocando o que? Leonardo, claaaaaro! Até quando ainda havia Leandro. O cunhado, repentinamente, surgirá na sala, vindo do quintal com os pés descalços e sujos pela terra ainda unida debaixo da mangueira, cantando desafinadamente mais alto que o som, com os braços abertos e estendidos ao noivo, um copo de alumínio cheio de cerveja numa mão e a garrafa na outra. Ele também estará com a camiseta da tchurma “Seja bem-vindo pra sempre no Goiás”, mas com um X em cima do nome do Estado, substituído, em pincel atômico vermelho, por “Iporá”.

Todos se apronchegam! Cada qual com seu copo vai entrando e já pegando um dos pratos, que estarão postos em forma de torre colorida em cima da mesa da cozinha e rumando, esfomiadamente, para o quintal, onde dois cavaletes de pintor e uma tábua larga por cima, fazem as vezes de outra mesa e sustenta as panelas com a comida do almoço. O cardápio: arroz branco, arroz à grega, feijão de caldo, feijão tropeiro, carne de lata (carne de porco frita e guardada por semanas em latas de 20 litros, compradas com tinta), almôdegas, uma bacia enorme de macarrão número 5 (aquele com um buraco no meio, que você tenta chupar, ele assovia e não entra na boca) com molho de extrato de tomate elefante, maionese de batata e ovo e tomate picado com óleo de soja e cebola de folha rasgada com o dedo. No final do banquete, uma mesinha menor com um recipiente Duralex marrom, servirá a sobremesa: arroz doce.

A bebedeira, a comilança e a música seguirão com a mesma intensidade até o domingo, quando, enfim, o noivo cairá pelas tabelas bêbado e, com princípio de coma alcoólico, será levado ao hospital municipal para tomar glicose na veia, aplicada por uma enfermeira prática, formada pelo extinto Mobral, com especialização pelo Telecurso Segunda Grau. Todo o comboio que o acompanhou desde a aeroviária até Iporá seguirá junto. Desta vez, com a noiva, não menos embriagada e com um copo de sal de fruta na mão, tentando aliviar a azia causada pela mistura bombástica, nem um pouco leve, do cardápio de quatro dias de festa e muita cachaça. Quando chegar a segunda-feira, ele, o noivo, dormindo no quarto cedido pelo cunhado, abrirá os olhos. Vai mirar um ponto no telhado da casa e dizer baixinho, com um sotaque digno de goiano genuíno: “Divino Padeterno! Nossinhora, meu Deus! Ah, nem...”. Dará um suspiro, virará para o canto e resolverá pensar na vida depois que a ressaca passar.

Rimene Amaral

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Justine Ghofiri Stwart


E quem pensou que a família de Irving tinha acabado se enganou! Conheçam Justine Ghofiri! Ela tem uma história emocionante! 

Esta é uma parte da vida que Mr. Carl, e toda a família Stwart, desejaria esquecer. Principalmente em respeito à matriarca, Ms. Glenda Awa Stwart. Mas não podemos deixar de apresentar todos os personagens dessa família que ganhou meu coração. A foto da vez é de Justine Ghofiri Stwart! Como perceberam, uma esquila negra, cheia de vida, esperta e independente. Justine é filha bastarda de Mr. Carl J. D. Stwart, o patriarca, reconhecida judicialmente por ele, depois de uma briga que abalou todas as estruturas da requintada sociedade da fauna ‘centralina park novaiorquina’. Acostumado à vida aventureira de solteiro, quando andava pelo mundo todo em busca de emoções, o garotão Carl Stwart partiu o coração da então jovem Glenda Awa, assim que se casaram. 

Ainda nos tempos em que entrar de gaiato num navio era coisa fácil, Mr. Carl, o pai de Irving, que há pouco havia se casado com Ms. Glenda, ficou sabendo de uma embarcação que sairia de Nova York rumo à África. O sonho de conhecer o continente dos “strange large animals”, como ele mesmo dizia, fez seus olhos brilharem e, com o consentimento da jovem esposa, partiu para uma longa aventura. E bota aventura nisso! Munido apenas de um embornal com um tônico licoroso fortificante, preparado por Wilbur Ross J. D. Stwart, o Tio Wil, seu meio-irmão feiticeiro, Mr. Carl foi a pé da esquina da 5th Avenue com a 59st até a embarcação que estava ancorada na margem direita do Hudson River, de onde ganharia o mar até chegar à África. 

Assim que avistou a escotilha por onde entraria e viajaria tranquilamente, o jovem Carl acelerou os passos. Em pouco tempo já estava familiarizado com todos os outros animais escondidos no porão da pequena nau. Há dois dias em alto mar, ele conheceu Radhiya, uma legítima esquila mulata. O tônico que Carl levava no embornal, já fermentado, estava também alcoólico e, numa noite de lua cheia, em alto mar, o jovem Carl, embriagado, sucumbiu aos encantos de Radhiya. Antes que a nau aportasse no continente africano, a jovem já sentia os primeiros sintomas da gravidez. Carl ficou apavorado! 

Os dois ficaram juntos durante toda a temporada dele na África, onde Radhiya morava na Tanzânia. Quando a pequena esquilinha nasceu, Carl voltou para Nova York. Poucos meses depois, recebera uma carta avisando do falecimento de Radhiya, por afogamento, quando voltava para os Estados Unidos em outra embarcação e caiu em alto mar, no meio da madrugada. A carta foi escrita por um rato de porão que havia acompanhado a aventura do jovem casal quando tudo aconteceu. Este mesmo rato cuidou da pequena Justine. Foi ele quem a entregou, pessoalmente, a Mr. Carl, em sua toca, no Central Park. Por azar, Ms. Glenda estava em casa no momento da inesperada visita. 

E quem pensava que não havia escândalos no mundo animal, ainda mais na seletiva sociedade que vive no Central Park, em Nova York, eis que a história mostra o contrário e apresenta provas. Ms. Glenda ameaçou colocar a toca abaixo, chamou todos os parentes, vizinhos e amigos e anunciou sua debandada da região. Iria para Massachussets, passar uns tempos no Boston Public Garden e refazer a vida. Mas a tempestade daquela noite a fez esperar e esfriar a cabeça. Um chá de casca de nozes a acalmou e, no dia seguinte, com sol e calmaria, Ms Glenda sugeriu que Mr. Carl registrasse a pequena Justine e desse a ela o nome da família. Sugeriu mais, que acrescentasse “Ghofiri”, nome de origem Suarili, muito comum no Quênia e na Tanzânia, que significa “Perdão, perdão!”. 

Hoje, Justine tem Ms. Glenda como mãe, apesar de conhecer a história. Estuda música nas horas vagas e pretende ser historiadora. Tenta, já faz algum tempo, ter alguma notícia da família africana através de sites de buscas de pessoas desaparecidas na internet. Mas vive em uma família completa e se sente orgulhosa por ser uma legítima Stwart!