quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Não vou “comemorar”


Quando os cabelos brancos extrapolam as madeixas e invadem a barba pelas laterais do rosto, a vida passa a ter outros sentidos. Não damos mais tanta importância às notícias de vizinhos e colegas de trabalho. Os assuntos nas mesas de bar passam a ser projetos para o futuro. Amigos, aqueles verdadeiros, passam a ser parceiros dos nossos sonhos. E como sonhamos mais... Não apenas em ter mais dinheiro, mas em fazer algo que nos traga satisfação.  Eu mesmo era perdulário! Digo isso porque, na semana passada durante ‘aquela faxina’, consegui me desvencilhar de muita coisa que havia comprado e não tinha usado. Em alguns casos, nem me lembrava mais que tinha comprado. Qual não foi a minha surpresa em descobrir que tinha em casa um modelador de hambúrgueres, depois de ter ficado decepcionado, algum tempo atrás, por não ter conseguido comprar algo semelhante em um site de compras? Enfim, muda-se o foco.

Esta semana foi tranquila. Em outros tempos ela teria sido tensa, à procura de lugares especiais, comidas diferentes e bebidas idem que agradariam a uma legião de amigos por um prazo de quatro horas, não mais que isso, que duraria a comemoração do meu aniversário. Farei uma travessa de macarrão, com muito molho, para comer acompanhado de um vinho que não é todo dia que se bebe, ouvirei a música que quiser, no volume acima do normal, quantas vezes eu quiser. E, apesar de não estar em companhia de pessoas que gosto, não me sentirei só. Amizade a gente guarda para todo dia e não apenas para o dia das comemorações.

Vou aceitar todos os abraços, todas as felicitações e cumprimentos. E melhor ainda se vierem acompanhados de presentes. Aí, sim, a felicidade é completa. Mas não farei torta doce ou salgada, não estourarei espumante e não receberei em casa com salgadinhos de festa. Bem diferente dos aniversários de infância, quando minha tia passava o dia preparando um bolo – pão-de-ló com dois recheios: ameixa e abacaxi com doce de leite, coberto com glacê de claras – e, possivelmente, chorando no fim do dia por não ter conseguido fazer da forma como queria. É que, por causa do tempo chuvoso, o glacê não se sustentava em cima do bolo. Mesmo assim, tinha cantoria de parabéns, refrigerantes com gravatas e balas de coco embrulhadas em papel de seda colorido. Ficou a saudade.


Hoje farei do meu aniversário um dia de descanso. E farei somente aquilo que eu quiser fazer e comerei de tudo, sem me lembrar que um dia inventaram algo chamado “dieta”. Vou beber como se não houvesse amanhã – mas sei que haverá! – e me acabarei num prato de macarrão no fim do dia, depois de lanchar a terceira pamonha do ano, à moda, com pimenta e linguiça. Mas não vou me esquecer de ninguém. Apesar de o aniversário ser meu, são os meus amigos que sempre merecem os cumprimentos e meus eternos agradecimentos por estarem sempre ao meu lado, mesmo que no plano virtual. Parabéns a mim, obrigado a todos vocês.

Rimene Amaral, 07 de novembro de 2014

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Emoções em frascos




O olfato é, sem dúvida, o meu sentido mais aguçado e desde que me entendo por gente os cheiros fazem parte da minha vida como se fossem uma marca. Minha memória olfativa é infalível, é emotiva, é forte e me faz sair de mim para lugares e tempos remotos. A primeira lembrança que me vem à mente quando se fala nessa tal memória é a primeira florada da jabuticabeira da casa do meu avô. Eu era acordado pela chuva fina e insistente que caía naquela manhã de sábado e, pela janela entreaberta, entrava um frescor com cheiro de flor de jabuticaba, misturada ao café fresco que mau pai fazia. Nada mais aconchegante. Nada mais calmante e nada mais inesquecível... Lá se vão algumas décadas.

O tempo seguiu seu curso e eu fui aperfeiçoando meu olfato, selecionando os cheiros mais importantes da minha vida e guardando em algum lugar, aqui dentro, que eu mesmo nem sabia que ainda estavam lá. E, de repente, quando um desses cheiros passa novamente pelo seu nariz e você fecha os olhos, vem uma história de vida que me faz encher os olhos d’água, voltar no tempo e quase poder tocar o que a lembrança escancara, depois daquela cutucada em algum ponto guardado ali na memória. Até as pessoas parecem estar ali, do seu lado.

E, de tanto cheiros que me fazem sentir essas emoções, um deles é o cheiro de lavanda que, quando me conquistou, era apenas dentro de um frasco de vidro. Meu pai usava todos os dias pela manhã. Minha mãe também. Esse perfume de lavanda sempre se misturava a um cheiro de café fresco e me remetia, ainda criança, ao sábado de manhã, quando da primeira florada da jabuticabeira. Definido, então, que a lavanda era o meu cheiro preferido, cresci procurando todas as variações da planta. E foi em Paris que conheci uma touceira de lavanda, ao vivo e a cores, e pude me esfregar nela para sentir o perfume que ela exala quando tocada. 

Corri o mundo. Conheci lugares, pessoas, sabores e muitos cheiros. E dentre esses cheiros, mais lavanda. No sul da França, conheci uma lavanda com cheiro de... de vida! Comprei uns quatros frascos para não me esquecer mais. Em outra viagem, conheci um boticário, em Firenze, na Toscana italiana, que fabricava perfumes a partir do seu cheiro preferido. Adivinha? Claro, pedi um perfume de lavanda e a surpresa foi maior do que o esperado. Quando senti o cheiro do perfume já no vidro, depois de todas as misturas feitas, era exatamente o cheiro da lavanda que meu pai usava, mais de 30 anos atrás. Meus olhos marejaram quando fechei os olhos e voltei no tempo.

Esta semana fui convidado para o lançamento da fragrância Eau de Leonora, criada por uma das mulheres que mais admiro pela fineza, elegância, inteligência, simplicidade, firmeza, simpatia, beleza... e um monte de adjetivos que poderia passar horas escrevendo. Leonora Rocha Lima Nogueira conseguiu colocar em frascos mais que um líquido perfumado de lavanda. Ele garimpou no fundo da alma as emoções e as lembranças e fez com que tudo viesse à tona. Hoje, quando passei na loja para adquirir um frasco – faço isso com tudo o que tem cheiro de lavanda – senti-o na pele e fechei os olhos. Foi como ser sugado para uma dimensão diferente. Fui, novamente, jogado num passado que eu não me lembrava mais.

Veio aquela mistura de aconchego, de cama limpa, de banho quente depois de um dia de cansaço, de abraço de pai e mãe, de fim de tarde em casa com bolo saindo do forno. Revi uma vida que ficou na lembrança, apenas. E que lembrança! Leonora conseguiu colocar nos frascos muito mais que um líquido cheiroso. Ela colocou emoções, ela colocou o passado, a saudade, a felicidade... Ela conseguiu ser fiel à lavanda, que veio cheia de frescor, de energia – e calmaria, quando se quer! Ele colocou no frasco a lavanda arteira e cheia de nuances, conforme a pele respira. Ganhei mais um frasco de emoções e mais um pedaço da vida que havia ficado perdia no tempo e em algum lugar aqui dentro. Hoje tudo isso despertou, veio à tona e trouxe a emoção junto. Obrigado por me permitir isso novamente.

Para Leonora Rocha Lima Nogueira, que me fez reviver emoções.



sábado, 9 de agosto de 2014

O perigoso – a história do chuchu antes do voo


 Nada de viagens longas, de amuar na casa de desconhecidos – e pouco, na casa de conhecidos –, nada de malas que ultrapassassem o tamanho suficiente para duas calças, cinco camisas, lenços, meias e cuecas... Mesmo sendo uma das companhias mais agradáveis em quaisquer circunstâncias, meu pai sempre foi muito caseiro. Gostava de receber, de casa cheia, de movimentação. Mas havia lugares e datas sagradas para receber a visita dele. E, claro, aonde chegava conquistava seus espaços. Um deles era a cozinha.

Falar que papai cozinhava bem é chover no molhado. Isso todo mundo já sabe. Até quem não o conheceu. E, acima de tudo, não usava mais que uma meia dúzia de ingredientes e muita, mas muita simplicidade, como em tudo que fazia e no jeito de viver. Papai gostava de arroz moreno, feito na mesma panela que fitara a carne ou a linguiça. Gostava de farofa de pimenta godê, de abobrinha batida, de molho de quiabo com jiló – que ele nomeou de “molho verde” –, e de chuchu. E como gostava de chuchu. Da forma mais simples: alho, sal, pimenta, água e chuchu. Só! Uma comida das mais inocentes e, ouso dizer, mais sem sentido. Chuchu é o quarto estágio da água. Mas quem comia o chuchu que papai fazia, jamais olharia para o vegetal novamente com o mesmo olhar.

Pois bem... Numa das poucas viagens que meu pai fez que não fosse para Bahia – segunda terra-natal dele por escolha própria – a cozinha também foi um dos cantos mais frequentados da casa dos sobrinhos-compadres, Lena e Tadeu, em Vitória, no Espírito Santo. Durante a temporada, muita comilança, como não poderia deixar de ser. Comida baiana – já que a casa era de baiana –, muita moqueca, frutos do mar, cerveja... Uma infinidade de comidas, diríamos, de peso. De muito peso. O que, sem novidade, agravaria a função do fígado e faria com que todos, depois de uns dias, passassem a uma dieta mais leve. Papai nas rédeas do fogão não permitia isso.

No dia da volta para casa, papai acordou cedo e se enveredou na cozinha. Lembrando que os ânimos e a digestão ainda estavam prejudicados e, levando em consideração que passaríamos metade do dia em voos e aeroportos, era melhor preparar algo leve. Eis que surge o chuchu, mas numa versão “hard”, com muita pimenta. Foi aí que papai e todas as outras pessoas que conheciam a história passaram a chamar o chuchu de “perigoso”, numa clara evidência de contrassenso, depois de passar dias de enfarando de verdadeiras bombas em forma de comida. Riram todos, de soluçar, quando ele apresentou o prato de chuchu e disse: “Tenho medo de comer isso, já que vamos voar. Mas comeremos com calma porque isso aqui é perigoso!”.


Pelo chuchu, pelas viagens, pela simplicidade e pelas conquistas... Feliz Dia dos Pais ao meu pai! 

domingo, 27 de julho de 2014

O cozinheiro da Condessa F.


Para que Condessa F. receba todas as quintas-feiras, o trabalho do cozinheiro, um dos personagens principais desses dias tumultuadamente deliciosos, deve começar muito antes de os primeiros convivas chegarem. Aliás, as atividades para a realização do pequeno banquete, escolhido a dedo para cada um, da próxima quinta começam assim que o último convidado desta quinta-feira deixe o salão, com uma flûte de espumante nos dedos, rindo das cócegas que o perlage faz em seu nariz e trocando as pernas enquanto atravessa o portão, revelando uma silhueta engraçada, desenhada na contraluz pelos últimos raios de sol do fim do dia.

Enquanto a governanta dava as ordens aos serviçais para colocar o salão nos trinques, Condessa F. já estava recolhida aos aposentos, imersa numa banheira vitoriana com sais, flor de laranjeira e alecrim, com uma máscara de creme de pepino escondendo a pele alva da face. Era nessa hora que a mente do mago das caçarolas começava a fervilhar. Sentado à frente da lareira da sala principal, com taça de bourgogne na mão esquerda e um cachimbo de ervas cuidadosamente selecionadas – as mesmas que ele usava na alquimia dos pratos, sejamos claros! – na mão direita, ele começava a compor a base para o cardápio da próxima quinta-feira.

Às 11 da noite, Condessa F. descia a escadaria, envolvida em um hobby de seda branco estampado com flores de cerejeira, deliciosamente perfumada. Passava pelo cozinheiro com um sorriso faceiro e tomava-lha a taça, forçando-o a se levantar para pegar a garrafa e preparar uma nova carga de ervas – aquelas mesmas da horta, usadas nos pratos, lembremos! – para o cachimbo. Depois de tragar a primeira taça em silêncio ela iniciava a descrição dos convivas que estariam na recepção da próxima quinta. Era o que o cozinheiro precisava para criar a alquimia certa para satisfazer o paladar e os desejos escusos dos covidados e garantir que o trabalho de alcoviteira e casamenteira de Condessa F. não fosse em vão.

“Pimenta, noz-moscada, cardamomo e canela”, pensava o cozinheiro em voz alta, diante da sugestão de Condessa F. de convidar duas novas moçoilas para a próxima quinta. Com relação àquela senhora mal-humorada que sempre reclamava do encosto da cadeira, que cansava sua lombar, o cozinheiro resolveu ousar e pensou em codornas recheadas com farofa de erva-doce e molho de chocolate apimentado. Aos barões da cana-de-açúcar – herdeiros de um latifundiário que exportava o produto para regiões da Europa – o alquimista serviria bebidas a base de anis e mel, com toques de menta para refrescar o hálito. Os irmãos eram os mais cortejados e Condessa F. fazia questão de empurrá-los para uma jovem senhora qualquer.

Sem qualquer sacrifício, o cozinheiro ia criando os pratos, um a um, conforme a condessa sugeria os convidados. Pensou nas entradas e nos petit fours, a base de muita castanha e geleias. Então, viriam os chás e os drinques coloridos, com misturas inimagináveis de bebidas que fariam com que os convivas se soltassem ao ponto de ceder aos encantos que Condessa F. criava para enaltecer um e outro. A essa altura, todos estariam inebriados e propensos aos romances.

Depois seriam servidos os pratos quentes. Massas preparadas com manjericão, tomates frescos e queijos variados. Faisões assados inteiros, perfumados com molho de framboesas frescas e acompanhados de farofa de tâmaras e cebolas anãs caramelizadas. Risoto de arroz negro cozido em vinho e finalizado com azeite trufado e pimentas vermelhas salpicadas. Cada prato teria sua função, diríamos, aceleradora das atitudes de Condessa F. para com a formação dos casais, que também “vivia um pouco dos amores alheios”, como fazia questão de frisar aos mais chegados, depois de umas taças de espumante. As receitas fortuitas alcançariam os sentimentos mais íntimos dos novos estranhos apresentados a cada quinta.

As sobremesas – ah, as sobremesas! – essas dispensariam um tempo maior, para um trabalho mais elaborado. As frutas e os cremes, os chocolates, as ervas picantes e as pimentas lambuzadas em mel seriam degustados com licores finos e mais espumantes, porque o perlage era o que fazia as mulheres rirem. Isso atraía os homens e deixava Condessa F. em êxtase.

E quando mais uma quinta-feira terminasse os convivas novamente cruzariam o portão do salão, alguns solitários como chegaram, outros inebriados pelo álcool de mãos dadas, numa clara evidência de que o trabalho de aproximação, deliciosamente concebido pela condessa, tinha surtido efeito. Então, a anfitriã pegaria mais uma garrafa de espumante, subiria os degraus até o quarto, se despiria vagarosamente, pensando nos resultados que aquela quinta poderia render e mergulharia o corpo cansado na mesma banheira. Logo, ela desceria as escadas, perfumada e faceira, vestindo um hobby de seda vermelho, tomaria a taça de vinho das mãos do cozinheiro e iniciariam mais um cardápio para a próxima quinta. 

Leia também, para entender melhor, 
http://www.aredacao.com.br/colunas/46329/cassia-fernandes/condessa-f-recebe-as-quintas


Rimene Amaral é jornalista e fotógrafo e escreve o blog: http://odonodotempo.blogspot.

terça-feira, 15 de julho de 2014

Sangue nos olhos e fel nas veias


Um belo dia abro a minha caixa de correio e encontro uma correspondência do DETRAN-GO. “Olha, que coisa mais simpática! Meu Departamento de Trânsito me enviando correspondência!”, pensei. Não. Não era! Eram dois boletos para pagamento parcelado do meu IPVA, licenciamento e todos esses impostos adoráveis que nós brasileiros pagamos. “Que bom. Será mais fácil quitar o tributo. Mas onde está a terceira parcela?”, questionei. Bem, fiquei sabendo mais tarde que a terceira parcela chegaria para mim, também como correspondência, quando as duas primeiras fossem pagas. Olha só que coisa bem feita. De primeiro mundo!

Duas parcelas pagas e eis que recebo a terceira. Estava lá na minha caixa de correios como da primeira vez. Fiquei emocionado com a presteza do DETRAN-GO. Daí bateu a dúvida: como eu deveria fazer para pegar o meu documento, depois que pagasse a terceira parcela? Fui atrás e fiquei sabendo que eu receberia o documento também pelos Correios. Que emoção, gente! Mas o último atendente me alertou: “É preciso que haja alguém em casa para receber o documento!”. Pára tudo! Quer dizer que quem mora só e trabalha o dia todo não pode receber o documento em casa? Como é isso? Uma nuvem começou a se formar e voltei ao telefone à procura de informações. Após ligar quatro vezes para o número 154 – onde a certeza não impera nem sobre a questão de fome e sede de cada um dos atendentes – tentei mais uns oito números. Cada um que atendia me deixava, em média, 10 minutos esperando para tentar encontrar a resposta. Mas ninguém soube me dizer como eu deveria agir.

Finalmente a resposta veio depois que procureioutras pessoas que trabalham no órgão e se condoeram com a minha preocupação. Era assim: eu deveria desconsiderar o boleto para pagamento da terceira parcela que havia recebido em casa e retirar outro através do site do DETRAN-GO. Assim, segundo as informações, eu pagaria a última parcela na Caixa Econômica Federal (CEF), que fica dentro do Vapt-Vupt e já pegaria meu documento. Ufa! Fui lá e o fiz.

Dia 15. Vencimento do tal documento. Aproveito o horário de almoço para resolver as pendências. Como não sou cliente da CEF, enfrento uma fila no meu banco para sacar o valor em dinheiro, contadinho da Silva, inclusive os 56 centavos em moedas, e rumo para o Vapt-Vupt onde pagaria, já pegaria meu documento, voltaria ao trabalho e todos ficariam felizes para sempre, até o próximo ano. Vã ilusão!

12h53 entro na fila. “O sistema está fora do ar!”, grita a mulher de uniforma azul lá na frente. Paciência. É a única hora que tenho. Vamos esperar. 13h15. O sistema volta a funcionar. Chega a minha vez. “Senhora, preciso de uma senha para o banco também ou apenas para pegar o documento no DETRAN depois que eu pagá-lo?”. Ela me olhou, olhou para o documento, me fitou nos olhos e disse: “Com esse boleto retirado no site, você só vai poder pegar o seu documento em três dias!”. Meus olhos se encheram de sangue. Meu coração disparou. Senti um amargo nunca dantes provado invadir minha boca. Contei até um milhão em menos de cinco segundos. Respirei. Acima de mulher, num cartaz, lia-se algo do tipo: desacatar funcionário público em sua função poderia ser pior!


Respirei de novo. Profundamente, desta vez. “E como eu devo fazer, senhora, para que eu pegue o meu documento hoje e não precise voltar aqui e enfrentar tudo isso de novo?”, perguntei. Pelo que ela me disse, eu teria de pegar uma senha, esperar ser chamado, retirar um outro boleto – que vi, era exatamente igual ao que eu tinha nas mãos –, ir até a agência bancária, pagar, voltar, pegar mais uma senha, esperar ser chamado e, finalmente, depois de findado o dia e a paciência, estaria de posse do meu documento. Não acreditei. Mas peguei a tal senha. Número 231. O visor chamava a de número 190. 40 minutos depois, resolvi ir ao banco pagar o que eu tinha na mão e voltar no fim da semana, de posse de um pouco mais de paciência. A senha chamada ainda era a 214. Banco fechado. Me encaminharam para uma casa lotérica. Documento pago. Agora é aguardar a sexta-feira chegar e enfrentar, mais uma vez, os serviços mal oferecidos do DETRAN-GO, com sangue nos olhos e fel nas veias. E sorrindo ou ainda posso ser preso por desacato.

terça-feira, 1 de julho de 2014

02/07: aniversário do meu pai - O sanduíche de pão de queijo


Na geladeira de casa muita coisa não podia faltar. Mas uma tuperware verde de tampa branca, redonda, tinha seu espaço garantido, no canto traseiro da segunda prateleira, sempre ao lado de um pirex de doce ou de um resto de comida. O conteúdo era preenchido duas vezes por semana, numa empreitada que levava todo o fim do dia e quatro mãos: as de mamãe e as de papai! Mas era na sexta-feira que a massa de pão de queijo era feita numa quantidade mais substancial, dado ao fim de semana que, geralmente, trazia visitas.

Papai sempre foi um apreciador de boas iguarias, da boa mesa, da boa comida e... de qualquer comida! Glutão contumaz, sempre inventava alguma coisa que fosse além da receita tradicional. O pão de queijo, por exemplo, depois de retirada a parte da massa que seria guardada na tal tuperware verde, ganhava um toque de orégano, alho... me lembro até de uma vez que ele acrescentou pedacinhos de bacon à massa. Ficou uma coisa sem explicação! Ainda fecho os olhos e posso sentir o gosto.

Todos os dias, inevitavelmente, pela manhã – e papai acordava bem cedo! – enquanto a água para fazer o café estava no fogo, ele enrolava os pães de queijo e os mandava para o forno. Aliás, era o cheiro do pão de queijo que nos buscava na cama, no sábado, e nos fazia correr para a mesa do café da manhã. Na maioria das vezes, eu voltava para a cama depois. Mas como papai era avesso à dormidas até tarde, ele começou a criar novidades para que o café da manhã se tornasse mais atrativo e demorado. Foi aí que surgiu o Sanduíche de Pão de Queijo, de autoria licenciada do meu pai, o primeiro e, até então, único em toda a galáxia.

A primeira versão era apenas com mortadela e queijo. Aliás, acho que por ser original, a que eu mais gosto até hoje. Era servido sempre com uma caneca de café. Depois, papai começou a dar uma incrementada e surgiram as versões atum, presunto com molho tártaro (aliás, molho tártaro, junto com o ar e a água, era produto essencial para a vida de papai!), queijo parmesão com orégano e pimenta calabresa, além de outras que não me recordo agora. Para as festas de fim de ano a versão peru com passas (no Natal) e pernil com queijo (no Ano Novo) eram as que mais saíam. E acabaram entrando para o cardápio convencional do dia-dia, juntamente com o sanduíche de pão de queijo com bife. Você precisa experimentar!


Feliz aniversário para o meu pai! Saudades do pão de queijo, do café, da peixada, do sarapatel, do churrasco, do arroz com carne seca ou linguiça... Saudades do acarajé, mesmo com alho, do controle remoto de bambu, da abobrinha refogada com muita pimenta, do chuchu – também conhecido como perigoso (conto essa da próxima) – e de tudo o que me lembra uma das pessoas mais importantes da minha vida. Parabéns, pai!

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Lá de cima


Vista assim do alto nem parece amedrontar. Mas Nova York está longe disso. A impositora megalópole consegue acolher tão bem quanto a dona Efigênia, do quiosquezinho de beira de estrada, na BR-101, no sul do Brasil. Bem diferente daquela senhorinha de oitenta e tantos anos (nesse caso os “tantos” são bem menos que seus oitenta), Nova York se impõe, mas não sufoca. Abre os braços para receber qualquer um que queira conhecê-la, passeando, que seja de maca, pela 5th Avenue. Lá de cima, nem as buzinas, nem as sirenes, nem mesmo os gritos desafinados e agudos de dona Efigênia podem ser escutados. Mas, como uma oração, é possível perceber que a cidade inteira está aos seus pés. Percebe-se mais: que todo mundo que vê essa imagem, por esse ângulo, está mais perto de Deus.

segunda-feira, 31 de março de 2014

Diálogo com a vizinha de cima / Parte II: a faxina


 Era madrugada de sexta para sábado. Havia feito trabalho extra e, portanto, o descanso justo tinha sido atrasado. Meus 89 relógios, incluindo os de parede, marcavam 3h14 duma madrugadinha fresca. Ótimo para dormir. Tomei um banho, fiz uma “boquinha” e caí na cama. Quase 4 da manhã. Foram duas horas de um sono profundo e acalentador. Não mais que duas horas.

Às 6 horas, ainda escuro por causa do inverno, ouço um barulho estranho e quase ensurdecedor, devido ao silêncio que se fazia, ainda de madrugada. Acordei e quase grudei no teto, como os gatos quando são assustados e arrancados de um sono profundo. Até fazer a cabeça funcionar para entender o que estava acontecendo demorou um pouco. Não foi difícil confirmar que o barulho vinha, adivinha de onde? Do apartamento de cima.

A vizinha parecia ter acordado disposta a fazer uma faxina daquelas. Pelo visto – ou ouvido – ela começara por arrastar os móveis. E já tinha começado pelo sofá. Não tinha visto nada. Ainda estava na minha cama. Mas eu podia desenhar a cena toda: a vizinha de cima com um lenço amarrado na cabeça, uma camiseta das Óticas Sollaris toda relaxada e uma bermuda de lycrapreta. Nos pés, as legítimas: havaianas brancas com as tiras azuis.

Esperei mais um pouco antes de tomar qualquer decisão. Mas ela parecia querer colocar o sofá dentro do banheiro, ou na sacada, na cozinha... sei lá. O que sei é que a vizinha de cima ficou durante meia hora arrastando alguma coisa lá em cima e impedindo-me de dormir. Tive de tomar providências.

Enrolei-me no roupão e, descalço, subi as escadas rumo ao andar de cima. 6h32 da manhã. A vizinha de cima abriu a porta.

A mulher do apartamento de cima: Bom dia!

Eu: Bom dia! A senhora vai dar faxina hoje?

A mulher do apartamento de cima: Ah, sim! Sábado é dia de f...

Antes mesmo de ela pronunciar a palavra ‘faxina’, me adiantei.

Eu: ... E de dormir até mais tarde também, expliquei a ela.

Ela fez um olhar de quem não havia entendido.

A mulher do apartamento de cima: Como?

Eu: Minha senhora, hoje é sábado. Trabalhei até de madrugada. Cheguei cansado e pretendo dormir pelo menos mais umas duas horas. Seria possível a senhora me permitir?
A mulher do apartamento de cima: Mas eu não estou...

Novamente a atropelei:
Eu: Está sim, senhora. A senhora parece estar arrastando seu sofá para o banheiro. Sofá fica quieto na sala. A senhora sabe que horas são? E a senhora sabe a que horas começou a arrastar as coisas em casa? E a senhora sabe que tem alguém no apartamento de baixo tentando dormir? Acho que conhece todas as respostas. Agora eu vou descer, vou voltar para a minha cama e vou dormir. Vou dormir sem qualquer barulho no apartamento de cima do meu até às 11 horas. Entendeu?

Ela balançou a cabeça afirmativamente e engoliu seco.

Eu: Passar bem!

A mulher do apartamento de cima: Bom dia!

Eu: Espero que seja. Só depende da senhora!

sábado, 1 de março de 2014

E quem não gosta de carnaval?


Você é daquelas pessoas que passam o ano todo programando o feriado de carnaval? Combina com os amigos? Aluga casa em Pirenópolis ou flat em Caldas Novas? Procura uma praia animada, onde a farra com gente desconhecida é garantida? Ferve em Salvador? Recife? Customiza aquela camiseta com pedras brilhosas e outras bijuterias? Junta aquela graninha suada para comprar uma fantasia e desfilar numa escola de samba do Rio de Janeiro? Passa a quaresma inteira postando nas redes sociais as fotos que tirou na Marquês de Sapucaí, lavado de suor e com as penas da alegoria se despencando? Tudo bem. Você faz parte da grande maioria de brasileiros e de gringos que aportam em terras tupiniquins para curtir a folia de Momo – que, de Momo, mesmo, ninguém tem nem notícia! Você está dentro da normalidade de um monte de gente que é apaixonada por carnaval.

Mas mesmo nascendo, crescendo e vivendo no Brasil, tem gente que não gosta de carnaval. Não tolera a jardineira que está tão triste, não quer saber quantos risos, oh!, quanta alegria e nem se há mais de mil palhaços no salão. Enquanto os foliões passam os últimos dias do ano – já que o Brasil só funciona mesmo depois do carnaval – se intoxicando, há quem passa o feriadão dormindo, lendo, comendo bem, assistindo a bons filmes e seriados. E tem gente que, acredite, passa o carnaval rezando. E se você é desses que preferem algo mais tranqüilo que a folia, aí vão algumas dicas para se divertir – ou não! – durante o reinado de Momo.

1.                  Assistir a seriados: É hora de colocar em dia todas as temporadas daquele seriado norte-americano que você comprou numa promoção do Submarino, por R$ 99,90. Em média, cinco temporadas. Cada uma com quatro DVDs. Cada DVD tem quatro episódios. Cada episódio, em média, 40 minutos. São 3200 minutos de filme, ou 53,333 horas. Tirando seis horas de sono por dia, mata-se um seriado todinho em três dias. Ainda sobra um dia e meio. Mais uns oito filmes ainda podem ser assistidos.

2.                  Vigiar a cidade: Minha amiga Maria Thereza Alencastro Veiga é dessas. A idéia é a seguinte: entre um intervalo e outro de um programa de TV, ou na pausa longa que você costuma dar para “descansar as vistas”, pode-se chegar até a sacada do apartamento ou à janela de casa e ver se tudo corre bem pela cidade onde, desde sexta depois das seis da tarde, é possível andar nu pelas ruas. Atenção! Qualquer movimento suspeito que não seja um cachorro correndo, um pombo dando um rasante numa estátua ou um catador desavisado procurando latinhas de alumínio é motivo suficiente para correr e chamar a polícia. Você pode ajudar a manter a ordem.

3.                  Visitar os parentes: Momento propício para visitar aquela tia doente de erisipela, que não anda mais faz uns seis anos e, na última vez que te viu durante a ceia de Natal de 2008, te chamou de desnaturado. Passe numa padaria boa e compre meio quilo de cada quitanda – pão-de-queijo, broa de fubá, enroladinho, diplomata... –, umas quatro caixas de suco de pêssego e leve como demonstração de que você se importa, sim, com ela. Aquelas laranjas descascadas por máquinas também são excelentes para essas ocasiões. O problema será achar os vendedores, que devem ter corrido para vendê-las na folia da cidade mais próxima. No mais, mantenha a tia com a boca cheia. Isso vai evitar que ela fale demais e que você ouça o que não quer.

4.                  Cozinhar: É um bom momento para abrir um daqueles sites de “culinária prática para iniciantes” ou pegar aquele livro “Dona Benta”, que você ganhou num amigo secreto naquela empresa em que você trabalhou na década de 1990, e colocar em prática todos os dotes culinários que nunca teve. Vantagem: os supermercados estarão vazios e você vai poder comprar todos os ingredientes com calma e não vai gastar muito tempo na fila do caixa. Desvantagem: é feriado e a empregada só virá no fim da outra semana. A sujeira toda será só sua e você ainda corre o risco de passar dias comendo a mesma coisa para não deixar perder o que sobrou, já que as receitas são sempre para mais de uma pessoa e, quem se aventura pela cozinha pela primeira vez, quer ver volume!

5.                  Preparar uma horta: Mora em casa com quintal ou tem uma floreira na sacada do apartamento? Pronto! O principal você já tem: terra. Na sexta-feira à tarde, quando uma imensa multidão formar filas de veículos nas rodovias a caminho da folia, você estará num viveiro de mudas ou num supermercado escolhendo as sementes. Compre três ervas de tempero (sugiro alecrim, manjericão e tomilho), uma espécie de pimenta e alguns tubérculos. Não se esqueça do adubo, da terra preta e de um regador. Se você tiver preparo físico e os exercícios para a lombar não o faz sofrer, você conseguirá fazer sua horta no fim de semana, tran-qui-la-men-te. Vai sobrar ainda dois dias e meio para ler tudo sobre “Como ter uma horta em casa”. Ensina-se até a plantar em garrafas pet.

6.                  Arrumar os armários: Seu janeiro passou tão rápido que você, assim como eu, deixou de fazer aquela faxina? Então é hora de deixar preguiça de lado, já que fevereiro dá os últimos suspiros. Papeis tidos como importantes, notas fiscais, comprovantes de compras com cartão de crédito, listas telefônicas – sim, elas ainda existem! – as centenas de propagandas da nova pizzaria do seu bairro, os cartões de visita que você jamais vai se lembrar de quem são, quilos de chamex com anotações inúteis, revistas velhas, jornais e similares. Separe tudo e chame uma associação que venda o papel para a reciclagem. Você ainda faz uma boa ação.

Mas se nenhuma dessas atividades te agradar, que tal abrir uma boa garrafa de vinho – ou duas. Quem sabe três? –, convidar os possíveis amigos que também estão à espera de alguma coisa para fazer, encher a mesa de batatas ruffles de todos os sabores e amendoins japoneses, preparar aquele set de músicas que você não escuta há anos e se entregar à sessão naftalina? No fim das contas, vai dormir tranqüilo e o carnaval servirá, ao menos, para reparar as olheiras. Bom carnaval. Bom sono. Axé!

Rimene Amaral é jornalista e fotógrafo

http://www.aredacao.com.br/artigos/40913/e-quem-nao-gosta-de-carnaval

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

O fim mais certo para os personagens de Amor à Vida...


Paloma: Tropeça numa calçada irregular, quebra os dentes e fura um olho. Passa o resto da vida fazendo fisioterapia.

Bruno: Adquire cisticercose e entra em coma. Pronto!

Ninho: Começa a vender baseados prontos na Praça da Sé. É escalteado por um diretor de Hollywood e ganha papel em Breaking Bad. Um ano depois ele acredita que o seriado é a vida real e tem uma overdose.

Félix: Vai preso. Depois de tudo o que fez, né, Braseew?, tem que pagar. E será, no presídio, amigo da garotada!

Pilar: É encaminhada para um spa, mas não o da Clara Matolli.

César: Tem um AVC de último grau. Baba sem sentir e faz todas as sujeiras na roupa.

Márcia: Ganha na loteria e compra a casa da Griselda. Vai viver de renda e morar no Marapendi Dreams. No futuro, será assassinada por Tereza Cristina.

Valdirene: Com o dinheiro que Márcia deu pra ela, monta uma churrascaria e uma pizzaria. Abre falência em quatro meses.

Ordália: Abre um puteiro. Vira cafetina e chama Wanda para uma sociedade, com franquias na Holanda e Turquia.

Dr. Herbert: De repente, some. Assim como veio, vai…

Paulinha: Deixada no lixão com Mãe Lucinda, vai ser responsável por cuidar das carraspanas do Nilo.

Thales: Como todo escritor romântico de séculos atrás, passa as noites frias de São Paulo com os pés numa bacia de gelo para morrer de tuberculose.

Niko: Vende a casa, compra um ônibus e vai vender sushi na estrada como uma espécie de Priscila tupiniquim.

Eron: Redescobre os sites eróticos e vira garoto de programa.

Amarilys: É seqüestrada por Wanda e Ordália e vira escrava sexual em Ancara.

Michel: Escorrega na banheira do motel, bate o saco na garrafa de champanhe francesA, fica estéril e perde a libido.

Patrícia: Surta e abre um sex shop. Usa todos os vibradores diariamente e lança uma espécie de cartilha explicativa sobre os brinquedinhos.

Silvia: Perde o registro da OAB e se entrega ao vício das drogas.

Edith: Casa-se com Wagner (o mordomo) e vai morar em uma edícula no fundo de uma mansão onde os dois trabalham: ela como babá e ele como copeiro e escravo sexual da madame, dona da mansão.

Jonathan: Internado numa clínica psiquiátrica com transtorno tripolar, não dorme à noite, procura seus pais na internet o dia todo e não conversa com pessoas cujos nomes começam com as letras E, F, C e T.

Tâmara: Vivendo com Cuocodilo Dande, some para a Austrália. Há relatos de que ela será morta por um gnu e sua carcaça comida por hienas.

Lutero: Encontra Flora, que lhe dá de presente o livro “O Médico e o Mostro”. Assume a personalidade de Silveirinha.

Atílio/Gentil: Percebe que a dupla personalidade é coisa do demônio e encara o personagem de Ariano Suassuna em O Alto da Compadecia.

Denizard: Explode!

Carlito: Monta uma escola e passa a dar aulas particulares de português para treinar cicerones que vão receber turistas durante a Copa.

Dona Bernarda: Raspa a cabeça e volta a costurar roupas para as bonecas de Victor Valentin.

Perséfone: Explode!

Gigi, Murilo e Sandrinha: Morrem soterrados pelos escombros da casa onde moram.

Dr. Jaques: Acusado de erro médico, perde o registro e se casa com Priscila.

Priscila: Explode!

Daniel: Abre uma academia para a terceira idade.

Gina: Vira pastora e passa as tardes visitando os pobres para ler a palavra de Deus. Quando ela sai de casa, o marido dá um beijo nela e a inentiva: “Vá, meu amor, fazer a boa ação. Vá Gina... Vá Gina!”

Elias: Passa o dia em casa cuidando dos 17 filhos que terá com Gina. À noite, faz biscate como garçom no bar que era de Denizard, o sogro.

Laerte: Morre em decorrência da Aids.

Ianiá: Morre em decorrência da Aids.

Neide: Vira assistente social e vai trabalhar num asilo de autistas.

Linda: Passa o resto da vida tentando entender o que Rafael tem que ela não tem.

Rafael: Passa o resto da vida sendo acariciado por Linda naquilo que ele tem e ela não.

Amadeu: Segue na vendinha do hospital.

Renan: Faz uma cirurgia plástica para melhorar o rosto e acaba sendo sequestrado por E.T.s.

Vega: Vira uma melancia verde (Saramandaiando).

Ciça: Morre engasgada com uma uva.

Joana: Entra em depressão e passa a frequentar o MADA (Mulheres que Amam Demais Anônimas) depois que encontra Luciano se atracando com uma enfermeira na UTI do São Magno.

Luciano: Se torna polígamo.

Pérsio e Rebeca: Se casam e montam uma frente de assistencialismo às vítimas da Faixa de Gaza.

Lídia: Monta uma casa de chás e passa a vender Herbalife.

Vanderley: Confundido com um bambu, procura Silvio Santos e explica o resto da piada pra ele.

Vivian: Explode no Peru, depois de encher a cara e acender um cigarro enquanto arrotava.

Maciel: É contratado como motorista de ônibus pela Prefeitura de São Paulo e morre carbonizado em um incêndio causado pelos bandidos maranhenses... (?)

Ignácio: Tenta acabar com o casamento da Carla Perez porque quer a loira a qualquer custo.

Reinaldo: Explode!

Aline: Foge da cadeia, foge do país (porque nessa novela isso é possível) e vira sócia da Clara Matolli no spa no Caribe.


segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Paciência a quilo



Quem nunca comeu num restaurante por quilo que atire a primeira colherada de fricassê. Com o tempo escasso, durante a semana, os restaurantes ‘entre-sirva-pese-coma-e-pague’ ganharam mais clientes que as lojas que vendem artigos chineses ao preço de R$ 1,99. Antes restritos a arroz, feijão, carne, alface e tomate, os restaurantes agora têm um cardápio variadíssimo, com saladas diversificadas ao ponto de deixar qualquer macrobiótico com inveja. As massas, as carnes – inclui-se churrasco – e as sobremesas fazem qualquer pessoa se sentir num banquete diário na hora do almoço. Esse é o problema. Tem coisa demais para escolher.

Assim que se entra no restaurante já se esbarra no fim da fila. Sim. Há filas longas e lentas, primeiro, para pegar o prato. Depois começa a exposição das bandejas. Freqüento um restaurante que oferece nada menos que 54 tipos de salada. Há coisas ali que nunca imaginava existir. E olha que conheço bem de comida. Junto com o que pode ser servido como entrada vêm os patês, suflês e todos os pratos derivados da culinária francesa, incluindo o fricassê – que fiquei sabendo há pouco, o original não contem frango. Começa a via-sacra e o teste de paciência.

À sua frente sempre tem: uma garota magra que conta os caroços de lentilha que estão na colher e vão para o prato; uma mulher de meia idade que se propôs a entrar na dieta justamente naquele dia – esta, ainda na dúvida, coloca tudo no prato e depois devolve metade porque a consciência pesou com a quantidade de batata; uma mãe tentando convencer o filho que acabara de sair da escola a comer alguma coisa que não seja arroz e batata frita; um senhor que não consegue enxergar direito e enche o prato de grão de bico, achando que são bolinhos de queijo e, quando percebe o engano, cai na risada e devolve tudo para a bandeja, jorrando saliva num raio de quatro bandejas para cada lado – já me eliminam oito ‘misturas’... e a paciência.

Tem também aquela dondoca indecisa, uma das figuras diárias que mais me irritam nas filas dos restaurantes. Ela coloca 17 pedaços de beterraba escolhidos cuidadosamente – todos medindo dois centímetros cúbicos – e percebe que é demais. Devolve oito para a bandeja. Viu que ficaram nove. Mas ela gosta de números redondos e pega mais um. E assim ela faz com o arroz, o feijão e tudo o que pode ser contável naquele infindável cardápio. Eu estou ali, bem atrás, esperando pacientemente que ela se decida pelas suas quantidades. Quase desejo sua morte.

Dia desses havia uma senhora bastante debilitada à minha frente, na fila, não sei se surda ou com mal de Alzheimer. E eu esperando com toda a paciência que Deus me deu. A acompanhante dela gritou seis vezes perguntando se ela queria “patê de palmito com salmão defumado”. Seis vezes! Tive de intervir e abortar a sétima tentativa. Expliquei que palmito, para uma senhora daquela idade, poderia causar botulismo. A acompanhante botou a mão direita no peito, apertou os olhos, exclamou alguma coisa que não consegui entender e passou para o próximo prato. Agilizei a fila em dois minutos, um ganho considerável de tempo, visto que em alguns momentos a fila para.

Daí vem o churrasco e as pessoas acham que estão em casa, num sábado à tarde, à beira da piscina e sem nada mais para fazer do que ouvir pagode o resto da tarde e jogar conversa fora. Exigem que o churrasqueiro pegue todos os espetos para ver qual é a carne que mais vai agradar. Quando alguém aponta a carne com o pegador e pede pra ver do outro lado e não sabe se aceita ou não, eu desisto. Fico só no carboidrato com salada porque, naquele momento, a paciência já era e a fome está indo junto. Sem falar com ainda é preciso enfrentar a fila da balança e encarar o garçom, que sempre espera a gente enfiar a primeira garfada na boca para chegar do lado e perguntar: “O senhor já foi atendido? Vai beber alguma coisa?”. 

http://www.aredacao.com.br/artigos/39046/paciencia-a-quilo