terça-feira, 15 de julho de 2014

Sangue nos olhos e fel nas veias


Um belo dia abro a minha caixa de correio e encontro uma correspondência do DETRAN-GO. “Olha, que coisa mais simpática! Meu Departamento de Trânsito me enviando correspondência!”, pensei. Não. Não era! Eram dois boletos para pagamento parcelado do meu IPVA, licenciamento e todos esses impostos adoráveis que nós brasileiros pagamos. “Que bom. Será mais fácil quitar o tributo. Mas onde está a terceira parcela?”, questionei. Bem, fiquei sabendo mais tarde que a terceira parcela chegaria para mim, também como correspondência, quando as duas primeiras fossem pagas. Olha só que coisa bem feita. De primeiro mundo!

Duas parcelas pagas e eis que recebo a terceira. Estava lá na minha caixa de correios como da primeira vez. Fiquei emocionado com a presteza do DETRAN-GO. Daí bateu a dúvida: como eu deveria fazer para pegar o meu documento, depois que pagasse a terceira parcela? Fui atrás e fiquei sabendo que eu receberia o documento também pelos Correios. Que emoção, gente! Mas o último atendente me alertou: “É preciso que haja alguém em casa para receber o documento!”. Pára tudo! Quer dizer que quem mora só e trabalha o dia todo não pode receber o documento em casa? Como é isso? Uma nuvem começou a se formar e voltei ao telefone à procura de informações. Após ligar quatro vezes para o número 154 – onde a certeza não impera nem sobre a questão de fome e sede de cada um dos atendentes – tentei mais uns oito números. Cada um que atendia me deixava, em média, 10 minutos esperando para tentar encontrar a resposta. Mas ninguém soube me dizer como eu deveria agir.

Finalmente a resposta veio depois que procureioutras pessoas que trabalham no órgão e se condoeram com a minha preocupação. Era assim: eu deveria desconsiderar o boleto para pagamento da terceira parcela que havia recebido em casa e retirar outro através do site do DETRAN-GO. Assim, segundo as informações, eu pagaria a última parcela na Caixa Econômica Federal (CEF), que fica dentro do Vapt-Vupt e já pegaria meu documento. Ufa! Fui lá e o fiz.

Dia 15. Vencimento do tal documento. Aproveito o horário de almoço para resolver as pendências. Como não sou cliente da CEF, enfrento uma fila no meu banco para sacar o valor em dinheiro, contadinho da Silva, inclusive os 56 centavos em moedas, e rumo para o Vapt-Vupt onde pagaria, já pegaria meu documento, voltaria ao trabalho e todos ficariam felizes para sempre, até o próximo ano. Vã ilusão!

12h53 entro na fila. “O sistema está fora do ar!”, grita a mulher de uniforma azul lá na frente. Paciência. É a única hora que tenho. Vamos esperar. 13h15. O sistema volta a funcionar. Chega a minha vez. “Senhora, preciso de uma senha para o banco também ou apenas para pegar o documento no DETRAN depois que eu pagá-lo?”. Ela me olhou, olhou para o documento, me fitou nos olhos e disse: “Com esse boleto retirado no site, você só vai poder pegar o seu documento em três dias!”. Meus olhos se encheram de sangue. Meu coração disparou. Senti um amargo nunca dantes provado invadir minha boca. Contei até um milhão em menos de cinco segundos. Respirei. Acima de mulher, num cartaz, lia-se algo do tipo: desacatar funcionário público em sua função poderia ser pior!


Respirei de novo. Profundamente, desta vez. “E como eu devo fazer, senhora, para que eu pegue o meu documento hoje e não precise voltar aqui e enfrentar tudo isso de novo?”, perguntei. Pelo que ela me disse, eu teria de pegar uma senha, esperar ser chamado, retirar um outro boleto – que vi, era exatamente igual ao que eu tinha nas mãos –, ir até a agência bancária, pagar, voltar, pegar mais uma senha, esperar ser chamado e, finalmente, depois de findado o dia e a paciência, estaria de posse do meu documento. Não acreditei. Mas peguei a tal senha. Número 231. O visor chamava a de número 190. 40 minutos depois, resolvi ir ao banco pagar o que eu tinha na mão e voltar no fim da semana, de posse de um pouco mais de paciência. A senha chamada ainda era a 214. Banco fechado. Me encaminharam para uma casa lotérica. Documento pago. Agora é aguardar a sexta-feira chegar e enfrentar, mais uma vez, os serviços mal oferecidos do DETRAN-GO, com sangue nos olhos e fel nas veias. E sorrindo ou ainda posso ser preso por desacato.

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